Eu estou contigo

23 de dezembro de 2024 15:05 1815

” SE LER, JÁ SABE, NÉ!?”

Como se as estrelas voltassem a brilhar no céu depois de uma fria e sombria tempestade, assim também o Natal subitamente volta a iluminar minh’alma com suas pisca piscantes luzinhas. Há muito tempo, confesso ter perdido o entusiasmo pela celebração do nascimento de Jesus: não sei se foi a sisudez dos anos, as inevitáveis atribulações da vida, a lacerante ausência dos que partiram, o aumento das desavenças familiares, a falta crônica de humanidade entre os supostos filhos de Deus. Pra ser ainda mais sincero, registro um sentimento de nostalgia ao relembrar, hoje, a alegria de outrora, da infância, desta remota leveza tributária de uma inocência mágica, a qual, inclusive, fomentava a ânsia de esperar, com um copo de leite e biscoitos, a descida do Bom Velhinho pela chaminé, pasmem, em um lar sem chaminé.
Então, vamos aos fatos. Neste mês de dezembro, me vi compelido a participar de um desafio aquático: nadadores intrépidos se dispuseram a percorrer 10km na belíssima Represa do Funil. A travessia teria início no píer de Macaia com destino à praia do Condomínio Náutico Porto Real (aliás, um destino magnífico, cercado da exuberância natural). Em tal cenário, prestes a ingressar n’água, entre petrechos de natação, caiaques & espíritos aventureiros, eis que sabias palavras preliminares de um bom-sucessense vigário me arrebataram. Antes do tiro de largada, o sereno padre Zé Maria iniciou seu discurso, e eu, em busca de uma motivação extra para suportar a iminente maratona aquática, era, claro, todo ouvidos. De forma simples, manuseando uma bíblia de capa vermelha prenhe de marcações, ao discorrer sobre a existência, ele ressaltou: “A vida adquire mais beleza, quando realizamos aquilo que gostamos e retiramos disso algum encantamento”.
EURECA! Ser feliz não é estar imune aos problemas. É saber extrair de tudo um quantum da grandiosidade universal. Isso, ato contínuo, me fez pensar onde devemos buscar – nós, os peregrinos da Terra – a essência de nós mesmos. Tudo vale a pena se estamos conectados a algo maior, a algo que ultrapasse os estreitos limites de nossos umbigos. Assim, naquele momento pré-prova, entendi que o essencial era a companhia dos outros esportistas, amigos que aguardavam minha chegada e aqueles que carrego no coração e não a água que me cercava. Vejam, ninguém é uma ilha! Como já profetizou Saramago: “É preciso sair da ilha para ver a ilha. Não nos vemos se não saímos de nós”.
O bem da verdade é que o maior desafio está em expressar nossos reais sentimentos perante quem, de fato, amamos. Tarefa bem mais complicada do que percorrer uma grande distância a nado. Dentre as cinco linguagens do amor, essa de ter que se expressar e expor nossos sentimentos no ar para deixá-los oxidando, pode ser bastante aterrorizante. Logo, um dos vários sentidos do Natal, talvez seja justamente esse. Empreender esforços para melhoramos o diálogo com familiares, amigos, e, por que não, com a gente do nosso cotidiano. Analisando por esse ângulo, a festa do dia 25 ganha foro de legítima solenidade, e nestes casos é sabido que alguém precisa se pronunciar.
Se existe um momento no ano em que as palavras ganham mais força, esse momento é o Natal. Não apenas por seus votos trocados à mesa, mas pela oportunidade de dizer o que, muitas vezes, fica guardado. Companheiros de silêncio durante o ano, é hora de trazer à tona temas que nos fazem verdadeiramente humanos: compaixão, perdão e generosidade.
A compaixão, essa arte de calçar os sapatos do outro, de sentir as pedras do caminho alheio, é mais do que um gesto: é uma abertura na armadura. A empatia, como dizem hoje, que nos desafia a olhar o mundo sob lentes diferentes. Vale o convite de tentar compreender, antes de julgar. E claro. Fácil falar; difícil praticar.
E o perdão? Ah, o perdão. Parece até pleonasmo ou ironia falar dele aqui, mas vale a lembrança da velha lenda do português Romão Fagundes. Fugindo da justiça por seus garimpos clandestinos, precisou se redimir com um gesto simbólico e grandioso: um cacho de bananas feito em ouro maciço, oferecido à Coroa. Cada um de nós, vez ou outra, precisa encontrar seu “cacho de bananas”, algo que nos permita pedir ou oferecer o perdão, e que sempre começa com a humildade de se redimir. Às vezes, é uma palavra, um olhar, um gesto, um ato de coragem.
Por último, a generosidade, que, no Natal, se traduz no ato de dividir com bondade. Penso no Papai Noel cover: sob a barba postiça, o gorro apertado e o calor de dezembro, ali está ele, uma figura quase heroica, doando tempo, energia e sorrisos. Não conhecemos seu rosto, e ele nem precisa de reconhecimento. Basta acolher, presentear com um abraço e, com um “HOHOHO”, fazer o mundo parecer mais leve.
Neste Natal desejo que nos dediquemos. Sim, com bastante afinco! Desejo que possamos usar nossas palavras como presentes. Não importa se sua casa está enfeitada ou não, se você é cristão ou ateu. Mesmo que essa magia não tenha te contagiado, jamais deixe de valorizar a companhia alheia. No dia a dia, nunca sabemos quem pode aparecer para nos mostrar um lado inédito da história. Viva, compartilhe! Do parente atrapalhado que esquece de comprar o panetone ao caiaqueiro que não te abandona. Felizes são os que, acompanhados dos seus, se mostram corajosos o bastante para se permitirem a comunhão.
Eu estou contigo!

Maxmiller Hübner

Compartilhe este artigo