
O tempo,
criança marota,
corre sem pedir licença.
Passava ligeiro
pelas ruas de Perdões,
pisando pedras,
dançando miúdo
sob o sol quente.
E a gente —
menino, menina —
sem saber direito
o que fazer
com aquele redemoinho
no peito.
Éramos quase gente,
quase rapaz,
quase moça.
Nem criança,
nem adulto ainda.
Suspensos
entre emoções.
O sorriso
nos olhos —
arrepio.
Na pracinha,
o velho banco
rangia segredos.
A luz — pouca —
era cúmplice.
A sombra, abrigo.
Lábios roçados:
quase beijo.
Mas o coração…
ah, o coração,
acelerado,
já batia inteiro.
Tinha bailinhos no clube,
carnaval de alma solta,
o caminho da roça,
rios e riachos
que sabiam de cor
o nome
da nossa liberdade.
Havia olhos nos muros,
sentinelas da calçada:
o mundo vigiando
o nosso jeito de amar
— torto, terno, inocente.
Mesmo assim,
a gente amava.
O cinema —
velho e cansado —
morria devagar.
A gente estreava ali,
de mãos dadas,
um filme só nosso:
roteiro escrito na alma,
final cortado
pelo medo.
Às vezes,
a gente ia mais longe.
Pele com pele,
tremor e calor —
uma ousadia
no escuro da noite.
Depois, silêncio.
Ninguém contava tudo.
Porque amor adolescente
é segredo sagrado.
Hoje, volto.
Perdões
me olha
com os mesmos olhos
de antigamente.
As esquinas
sussurram nomes
quase esquecidos.
O cheiro do cabelo dela,
o sorriso de seus olhos,
ainda moram em mim.
Cada sorriso guardado
me lembra:
o tempo leva muito —
mas não leva tudo.
Os amores primeiros
não envelhecem.
Ficam ali,
quietos,
intactos.
Esperando
um sopro de lembrança
no fundo do peito,
em silêncio.
Marco Túlio V. Alvarenga