Tião Alfaiate: a arte de vestir com personalidade

23 de janeiro de 2018 10:21 2909

A primeira entrevista de 2018 é com uma pessoa que sempre tem um sorriso no rosto e palavras de positividade.
Seu nome é Sebastião Pereira, conhecido como Tião Alfaiate, nasceu em 15 de junho de 1935.
Ele é filho de Geraldo Pereira e Maria da Conceição Pereira; irmão do Lelé (in memorian), Diléia (mora em São José dos Campos), Lazinho e Messias (mora em Varginha); casado com Delba Rodrigues Pereira; pai de 10 filhos: Luzia, Lizete, Marilene, Delbinha, Tiãozinho, Rita, Lidiane, Beth, Lisley e Kesley.
Entre giz, réguas, alfinetes, tesouras, ele exerceu com maestria a função de alfaiate. Quanta gente passou pelas medidas do Sr.Tião e apresentou-se em festas e eventos com elegância e estilo!
O senhor Sebastião no auge dos seus 82 anos é uma pessoa alegre, serena, que gosta de cuidar da sua horta e do seu jardim no grande quintal da sua casa. Após a entrevista ele nos mostrou esse paraíso da natureza que ele denomina ‘seu local de descanso e exercício físico’.
Lá encontramos fava, cebolinha, salsa, quiabo, couve, hortelã, manjericão, limão, mamão.
Tem também algumas espécies de rosas plantadas por ele e Tião Alfaiate nos conta que leva rosas para a liturgia das 7 horas na Santa Casa.
Horta, jardim e muito amor!
A entrevista foi gravada na sala de sua casa.
Jornal VOZ: Quando o senhor iniciou nessa arte da alfaiataria e quem o incentivou?
Tião Alfaiate: Iniciei lá no Romeu Alfaiate (Romeu Alves de Alvarenga) com a idade de 9 anos, lá na Rua Sete de Setembro, 81.
Trabalhava e morava, praticamente, na casa do meu tio Nestor, lá no Juca Thomaz, onde hoje, é o Ivinho e o Mirinho.
Fui aprendendo com muito sacrifício, mas afinal das contas, deu certo.
Jornal VOZ: E quando o senhor montou a sua alfaiataria?
Tião Alfaiate: Quando saí do Romeu já estava casado. Trabalhei por minha conta, depois trabalhei para o Nestor e aí que peguei a minha parte mesmo.
Fazia consórcio de roupa em Nepomuceno, Cana Verde, Santo Antonio do Amparo, Bom Sucesso. O que me colocou para a frente foi isso.
Jornal VOZ: Como funcionava esse consórcio?
Tião Alfaiate: Consórcio, eu arrumava 100 fregueses e tinha um determinado valor.
Eles pagavam durante 12 meses, mas cada um tinha o seu número. E todo mês sorteava-se um número. Aí o número sorteado continuava, sem pagar – ele retirava a mercadoria no valor de dez meses.
Eu ia para São Paulo, fazia as compras.
Jornal VOZ: Há quanto tempo o senhor parou de confeccionar os ternos?
Tião Alfaiate: Tem 10 anos e por último funcionava aqui em casa, num local separado.
Em 1980 coloquei uma confecção aqui, pegava serviço em São Paulo, uma firma muito boa – Petistil – inclusive ela exportava. Eles tinham as oficinas em Minas, São Paulo que trabalhavam para eles.
Davam o serviço cortado pra gente, trazia, confeccionava e mandava de volta.
Jornal VOZ: Formandos, autoridades, entre outros, procuravam-no para o serviço de alfaiate?
Tião Alfaiate: Sim, vinha muita gente porque no meu tempo, quase que praticamente, era só eu de alfaiate, vinha todo mundo. Eu tenho um fichário muito grande, guardado até hoje.
Quem pedia para confeccionar um terno, queria exclusividade – sob medida e um pano só para ele.
Ia para SP e trazia o pano encomendado, e se outro freguês queria um terno do mesmo pano, eu perguntava para o primeiro dono se podia fazer. Só confeccionava com sua autorização.
Jornal VOZ: As mulheres também pediam para confeccionar roupa?
Tião Alfaiate: Sim. Calça, terninho. E tudo na medida e na prova. Paletó se provava, no mínimo, duas vezes.
Jornal VOZ: E assim o senhor cuidou da sua família através da sua profissão?
Tião Alfaiate: Criei meus 10 filhos. Eu tinha os oficiais que trabalhavam para mim.
Tinha um oficial só para fazer paletó. Lembro de dois rapazes que eram mudos e trabalhavam para mim. Muito bons de serviço. A mãe deles que conversava com a gente.
Depois o Wanderley que mora em Campo Belo até hoje. Ele veio de Brasília e me informaram lá em Campo Belo sobre ele. Veio aqui e trabalhou muitos anos comigo; o ensinei do meu jeito e deu muito certo.
Jornal VOZ: E como era para acompanhar a moda?
Tião Alfaiate: O que mudava eram três ou quatro botões na frente; tinha um jaquetão que era ‘atravessado’, os bolsos com portinhola. Era perfeito!
Tenho os meus ternos, os meus paletós de antigamente. Eu cortava o paletó e levava para Lavras, pedia para o Rajá provar o paletó em mim. Ele provava, eu trazia e fazia.
Lá em Campo Belo, o Vitório, um alfaiate muito bom, eu fazia a mesma coisa.
Jornal VOZ: Quando o senhor falou ”está na hora de parar”?
Tião Alfaiate: Aposentei em 1985, mas continuei trabalhando e pagando INSS. Parei por um tempo e recebi aquilo que eu paguei. Naquele tempo era assim.
Lembro do Sr.Antonio Moreira, Gabriel Andrade – alfaiates muito antigos e eu tenho uma tesoura que foi dele. A viúva dele que me vendeu.
Tenho uma tesoura que fui comprar em Belo Horizonte. Cheguei lá no Rei das Casimiras, o Zé que eu tinha muita amizade, aí perguntei se ele conhecia um ‘tal’ alfaiate. Ele me direcionou para a Rua Rio de Janeiro. Antes disso veio um vendedor de BH e me pediu mil e cem, naquele tempo. Não quis comprar.
Fui atrás desse alfaiate em BH e perguntei qual o menor preço da tesoura – ele me falou ”Menos nenhum tostão, te vendo por setecentos”. Na mesma hora, peguei o dinheiro, paguei e já ia saindo com a tesoura sem embrulhar…Ele me chamou e a embrulhou num jornal e essa cena foi muito marcante e engraçada para mim.
Jornal VOZ: E quando a pessoa pedia um terno de última hora, o senhor ficava até mais tarde na confecção do pedido?
Tião Alfaiate: Acontecia sim, e não podia deixar o freguês ir embora, procurar alfaiates de Lavras, Campo Belo, tinha que se esforçar porque a gente precisava também. Eu também ia em Bom Sucesso, Santo Antônio, Nepomuceno – no Banco – eles escolhiam o pano das amostras que eu levava, retornava para cá, cortava, levava no mês seguinte, a calça pronta, o terno para provarem.
Jornal VOZ: E o senhor sempre encarou tudo com esse sorriso no rosto?
Tião Alfaiate: A vida tem que ser assim, você tem que levá-la satisfeito, porque na vida tudo é bom, nós é quem provocamos, às vezes, a ruindade e não a entendemos.

Finaliza Tião Alfaiate na sua franqueza e alegria de viver.

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