Artimanha

1 de fevereiro de 2021 10:11 359

Recomeçar nem sempre é fácil, mas é necessário que haja um recomeço para dar novo significado à vida.
Quando conheci o Flávio a atração foi inevitável, seu olhar e seu jeito tímido me encantaram.
Trocamos telefones e no mesmo dia Flávio me enviou mensagens. Sempre atencioso e muito carinhoso, falava comigo várias vezes ao dia, não demorou para me convidar para sair.
Nosso encontro foi perfeito, encheu-me de elogios, entre eles me disse: Camila você não precisa se maquiar porque Deus te desenhou com traços perfeitos. Fiquei entusiasmada e abandonei a maquiagem .
No segundo encontro me pediu em namoro, e dali em diante seguiu cada vez mais atencioso e preocupado, cuidando de mim nos detalhes. Suas ligações intensificaram e as mensagens de texto também. Queria saber a hora que eu saía, que chegava, se me alimentei, se já estava na cama. Bom dia e boa noite eram imprescindíveis.

Dois meses juntos, ele me pediu em casamento, disse que não aguentaria ficar tanto tempo longe de mim. Homem apaixonadíssimo! No mês seguinte se mudou para a minha casa.
Aos poucos me mostrou que era a pessoa que eu mais podia contar na vida. Entendi que os amigos que me cercavam não eram verdadeiros porque a maioria não simpatizavam com Flávio e consideravam minha decisão precoce. Enfim, me afastei dessas pessoas que fingiam querer o meu bem.
Seguimos eu e Flávio, tínhamos um ao outro e bastava. Ele era presente 24 horas por dia, me ajudava a decidir que roupa usar, algumas mais curtas e decotadas até doei, percebi que me deixavam vulgar.
No dia do nosso aniversário de um ano juntos, fiz uma surpresa. Saí mais cedo do trabalho, fui ao shopping comprar presente para ele. O problema é que me atrasei pra chegar em casa e isso o deixou furioso, principalmente porque não atendei as 57 ligações que fez para o meu celular. Eu queria fazer surpresa, mas ele não entendeu e me acusou de traição, desconfiou que eu estivesse com outro homem, cheirou minha roupa, meu pescoço e meus braços. Quando cheirou meu braço esquerdo, sentiu o aroma de perfume masculino, que eu havia provado numa loja, com a intenção de comprar para ele. Só que Flávio não acreditou e me esbofeteou. Ação que virou rotina daquele dia em diante.

O homem apaixonado se transformou num ser humano doente, abusador, torturador… E mesmo eu percebendo isso não conseguia deixá-lo. Às vezes que tentei romper, me ameaçou de morte.
Um dia, na saída do trabalho, encontrei um dos amigos que eu havia me afastado e ele ficou indignado com meu olho roxo. Não consegui esconder, chorei e contei tudo. Sem titubear ele me levou numa delegacia e pela primeira vez, depois de três anos apanhando, fiz um boletim de ocorrência contra Flávio. Sem que ele soubesse, naquele dia, o esperei dormir e peguei meus pertences principais e fugi.
Minha casa era alugada, então rompi o contrato por telefone mesmo. Pedi demissão do emprego, mudei o número do celular e de cidade.
Flávio foi intimado, mas não foi preso e até hoje me procura. Só que o gosto de me encontrar ele nunca terá.
Eu, Camila, aprendi algumas lições com essa experiência: possessão não é amor, todos precisamos de amigos por perto e controlar os movimentados com a desculpa de preocupação é manipulação e não cuidado.

Jeane Lima
escritora e poetisa

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