O egotismo caracteriza-se por uma atitude na qual o indivíduo se volta para si mesmo de forma exagerada.
Trata-se de um ensimesmar-se. Como todo mecanismo neurótico, esse também é um recurso de defesa e, portanto, em algumas situações se apresenta de grande valia para o desenvolvimento pessoal. Por exemplo, em psicoterapia, as pessoas passam necessariamente por um processo egotista, no qual se interessam muito por si mesmas e seus próprios problemas a fim de ampliarem sua consciência, seu senso de responsabilidade, sua autonomia e maturidade para realizar escolhas. Portanto, um modo provisório, deliberado e terapêutico de a pessoa estar no mundo. Por outro lado, o egotismo pode significar também uma postura fixa e rígida de relação com o mundo. Como uma atitude infantil, a pessoa mantém uma persistência cansativa com aquilo que quer, é imperativa no agir, não aceita opiniões alheias e sempre deseja realizar as coisas ao seu modo, mesmo que esteja errada. Obviamente, tais características de onipotência e autorreferência suscitam problemas na interação com outras pessoas. Se o campo social é composto pela alteridade e pela diversidade, esse perfil centrado em si, com uma preocupação voltada para as próprias necessidades e identidade, provoca sérias consequências negativas para o espaço público.
Numa perspectiva psicológica, o egotista é uma pessoa que não consegue renunciar ao controle e à vigilância, teme a perda da própria identidade e por isso refuta tudo que é novo, pois sempre o vê como ameaçador. Evita surpresas mantendo comportamentos rígidos e bem programados que aniquilam a capacidade de espontaneidade que o levaria ao crescimento pessoal. Nessa postura acovardada, ele evita decepções e frustrações que são sentidas como punhaladas no ego. Ele se defende da possibilidade de surpreender-se com as múltiplas experiências com o mundo, teme competir ou entrar em contato com alguém de forma verdadeira e profunda. Na sua falsa onipotência ele obtém uma satisfação pela vaidade. Faz isso se isolando em “verdades” como sendo a única realidade possível, ao passo que despreza seu meio. Ali, dentro de si, ele está no comando, todos em volta estão sob seu domínio e julgo. O egotista se disfarça facilmente na personalidade “independente”, é o “ajuizado”, “bem visto”, “modesto” e “correto”.
Mas o egotista vai pra rua. E lá ele se transforma no “egotista-político”: autoritário, politicamente alienado e pobre de espirito. A rua, que deveria ser o lugar do diálogo –capacidade de inclusão do outro, respeito à diversidade de ideias e ideais – se transforma em um campo de guerra, pois o egotista não suporta argumentos diferentes. As suas verdades absolutas, fundamentalistas, as quais ele defende com orgulho, é de tal amplitude sonora que não lhe permite ouvir a opinião de seus dissidentes. Todo egotista-político se sente meio sacerdote, são demagogos e manipuladores, agem com um proselitismo eloquente, a partir de falas prontas que ele introjetou sem o mínimo de pensamento reflexivo.
O ódio é uma característica marcante do egotista-político e se expressa na intolerância às variedades culturais, desrespeito ao outro e suas escolhas. Ódio que esconde seu pavor de se perder. Sua bravata odienta visa arquitetar histerias e delírios coletivos. Como se consideram o centro do universo, suas intenções justificam os meios utilizados, mesmo que de modo particular e ilegal. Em tempos de crise, aparecem como salvadores, propõe soluções fáceis para questões complexas, ou, no mesmo instante que inventam problemas ou doenças sociais. Com essa propagação do pensamento autoritário ele angaria multidões fascinadas pela repetição exaustiva de um discurso “glorioso”, como se não houvesse outro ponto de vista, outra perspectiva de ver o mundo, outras formas de existir e lidar com as questões de ordem coletiva, que deveriam ser respeitadas dentro de um regime democrático.
Na evolução do ser humano, o egotismo só se desfaz com a passagem da independência exagerada para a interdependência madura. No caso do egotista-político, sua indigência intelectual poderia ser corrigida através da abertura ao diálogo com o outro, enquanto desassocia este outro de suas ideias debatidas. Em ambos os casos é preciso coragem.
Henrique Aquino
Psicoterapeuta