‘Quem compartilha vídeo de estupro também comete crime’, dizem especialistas

6 de junho de 2016 15:08 1448

O vídeo de uma adolescente que sofreu um estupro coletivo no Rio viralizou nas redes sociais nos últimos três dias. As imagens, que mostram a garota nua e desacordada após ter sido estuprada foram divulgadas em larga escala no Twitter, Facebook e WhatsApp.

Advogados especialistas em crimes cibernéticos ouvidos pela BBC Brasil afirmaram que as pessoas que compartilharam o vídeo também cometeram um crime. “Publicar fotos com cenas pornográficas de sexo envolvendo crianças ou adolescentes é crime, com pena de 4 a 8 anos de prisão”, disse Thiago Tavares, professor de direito da informática na Universidade Católica de Salvador e presidente da Safernet – entidade que atua no combate a crimes cibernéticos.
Por outro lado, ele pondera que cada caso deve ser analisado pela polícia para saber se quem compartilhou teve/houve dolo (intenção) ou não. “A maioria das pessoas que distribuíram esse conteúdo na rede não serão investigadas porque não há o dolo. Ela pode ter divulgado o vídeo com a intenção de mobilizar a sociedade contra casos semelhantes ou ter feito com a intenção de denunciar, por exemplo. Mas só o juiz é que vai ponderar caso a caso”, disse Tavares.
A Safernet recebeu em 48 horas 3.741 denúncias de páginas em redes sociais que tinham compartilhado o vídeo. As publicações foram feitas em 638 links diferentes.
“Essa é uma demonstração do quanto viralizou. São 638 fontes diferentes. Isso ainda pode se espalhar muito mais devido à curiosidade das pessoas e a facilidade de compartilhamento”, afirmou Thiago Tavares.
O presidente do Safernet e um dos articuladores da criação do Marco Civil da Internet disse que a prioridade da polícia é punir os agressores da vítima e responsáveis pelo início da divulgação do conteúdo. Ele afirmou ainda que manter o vídeo armazenado no celular ou computador é crime e o dono do aparelho pode ser condenado a uma pena de 1 a 3 anos de prisão. “Quem recebeu o vídeo por WhatsApp ou outro meio deve apagar, destruir.”
As imagens exibem uma jovem deitada nua em uma cama enquanto rapazes conversam ao fundo. “Mais de 30 engravidou”, diz um deles. Em uma foto publicada por outro usuário, um homem aparece ao lado da jovem desacordada e ainda nua na cama.
“Não se apaga”
O professor de Direito digital da Universidade Mackenzie Renato Leite Monteiro disse que crimes cometidos na internet são mais fáceis de serem investigados se comparados à vida real. ” As pessoas acham que pelo computador conseguem manter o anonimato, mas a internet fornece muito mais prova que o mundo offline. É mais fácil saber quem publicou um vídeo na internet do que quem que furtou uma carteira na avenida Paulista (em São Paulo) por exemplo.”
Monteiro afirmou, porém, que a exposição das pessoas em casos de difamação e injúria na internet tende a ser muito maior e mais grave. “A internet não esquece. Há uma frase que diz que na vida real as coisas são escritas a lápis, enquanto na internet é à caneta. Nada se apaga. Daqui 20 anos você ainda terá acesso a informações produzidas hoje de qualquer lugar do mundo”, disse.
O professor também considera crime o compartilhamento de conteúdo como o da adolescente do Rio de Janeiro. “Se a pessoa poderia pensar ou entender que aquilo causaria dano e compartilhou, ela é responsável tanto civilmente como criminalmente.”
“Não tem nada a ver”
A própria mãe do jovem que divulgou o vídeo da adolescente no Twitter minimizou a ação ao confirmar, em sua página pessoal no Facebook, que o filho compartilhou o vídeo, mas não participou do estupro.
“Gente, sei que meu filho errou em compartilhar esse vídeo, mas ele não tem nada haver (sic) com isso”, disse a mãe do jovem. E concluiu com um pedido: “Parem de ficar postando minha foto e da minha filha, por favor.”
Felipe Souza
Da BBC Brasil em São Paulo

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